quarta-feira, 13 de junho de 2007

Zapeando entre os canais, eis que me deparo com a última novidade do futebol: outdoors móveis. Quem é ligado em futebol sabe do que eu estou falando. Fico alguns segundos parado observando, não o jogo, mas o pisca-pisca, hipnotizado. Pra quem não está a par, eu explico: os outdoors que cercam o campo agora são telas que alternam as propagandas, acendem a apagam com a mesma freqüência de um letreiro de néon e ficam rodando o campo. Realmente, não se sabe se se deve olhar o jogo ou o letreiro. Estratégia de marketing, é claro. Um jeito de chamar a atenção dos telespectadores para poder vender mais (e quantos olhares não são capazes de desviar, justo no "país do futebol"). Na hora pensei "perderam o senso do inconveniente...". Alguns dias depois, por acaso, resolvi olhar o Globo e no Segundo Caderno (do dia 9 de Junho) havia um artigo cujo título era: "Os slogans que matam a jogada", por Arnaldo Bloch. O Sr. Arnaldo não dispensou comentários para criticar o que estava acontecendo em campo.


"Claro que o objetivo é esse mesmo, dividir a atenção entre o jogo e a publicidade gritante durante noventa minutos, captar a distração quando a partida estiver ruim, e é claro que algum dinheiro não faz mal ao futebol. Mas, peralá, a gente termina a peleja com vontade de vomitar, com ódio dos anunciantes, inclusive dos que, eventualmente, mereciam simpatia."

Mas o mais interessante do artigo é um certo senso crítico que se deixa entrever. Arnaldo fala da tendência invasiva da propaganda na vida cotidiana, e principalmente do jeito que o futebol está cada vez mais degradado pela lógica da mercadoria. Robert Kurz já falou sobre a vocação totalitária do capitalismo, sem perdoar o "senso comum" de totalitarismo:

"Salta à vista que, nessa teoria do totalitarismo das duas esferas polares da sociedade, somente a esfera político-estatal é mencionada, enquanto a econômica permanece de todo ofuscada. Nesse sentido, só pode existir um Estado totalitário, mas aparentemente não uma economia totalitária, um modo de produção totalitário, um mercado totalitário. O axioma dessa consideração unilateral é que somente o Estado e a política integram o âmbito social, enquanto a economia - como já postulavam, no século 18, os fisiocratas e Adam Smith - pertence supostamente à natureza e extrapola, com isso, a teoria social em sentido estrito. Ora, leis naturais não podem ser totalitárias e ameaçar a liberdade; é preciso aceitá-las como ao tempo." (Robert Kurz, Totalitarismo Econômico... dá pra encontrar o texto na internet)

Ora, é cada vez mais óbvio que o capitalismo é totalitário. Hoje em dia, o capital define tudo em nossas vidas: os hábitos alimentares (fast-food), a concepção do tempo, as artes, os esportes, as relações pessoais... tudo é de alguma forma captado para o fim em si mesmo da acumulação. É óbvio que o tempo linear-abstrato do relógio já ultrapassou há muito tempo o âmbito do trabalho e invade a vida cotidiana, por exemplo. Já não podemos nem gastar alguns minutos comendo, já que a obrigação de consumir o tempo de forma utilitária está sempre cutucando em nossa cabeça... e é aí que entra o fast-food, seja no Mc Donald's ou no "chinês" da esquina. Daí o aumento significativo do número de obesos.

No capitalismo, tudo deve ser aproveitado, do contrário é "desperdício". O dinheiro foi investido e deve dar um retorno à altura. Para isso, os administradores, capitalistas ou não, devem estar sempre alertas. Não pode escapar um peido que seja dentro do local de trabalho que não sirva para "valorizar o dinheiro" (entoem o mantra, rapazes!). Apesar disso, o capitalismo não pode preencher toda a realidade. Se o fetichismo é a subordinação do concreto ao abstrato, também não é menos verdade que há sempre um jogo de forças. O trabalho abstrato luta para engolir o trabalho concreto, e apesar disso, sempre escapa alguma coisa. A dialética é a "razão da luta", como diz Holloway, e não uma "lei natural" ou coisa que o valha. Pode ser que eu tenha escapado um pouco ao assunto (afinal, futebol não é muito a minha praia...) - fato é que seria lindo se os torcedores invadissem um dia o gramado para acabar com aquela porcaria -, mas eu queria citar o último parágrafo do texto do Sr. Arnaldo:

"(...) todo mundo sabe que carnaval é business, que praia é business, que água é business, que fundo de prédio é business, que chão que a gente pisa é business, que meio ambiente é business, que ética é business, que política é business. Mas vamos com calma, senão daqui a pouco nosso amor vira business e até o ar que a gente respira vira business, e nesse dia nossas privadas piscarão, assentos luminosos, águas dançantes da bunda à alma, mas calma aí, alma não é bunda, ainda que bunda, tantas vezes, seja business."

Va de retro!

Um comentário:

JH disse...

salve, salve!

diálogos casuais... causais... causando boa impressão... e algo mais!

continuem no pique que tá bacana!