sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Trabalho e Loucura


Um estudo sobre a loucura do trabalho e do trabalho da loucura.

Introdução:

Pretendemos com este pequeno texto abordar de maneira introdutória as relações entre trabalho e loucura, isto é, as múltiplas maneiras dentre as quais estes se relacionaram dentro de um período histórico. Podemos começar dizendo que, pelo menos até o século XVIII, havia uma política institucionalizada da internação de ociosos, vagabundos e mendigos. Internação “justificada”, na medida em que a loucura até então não encontrava plena ligação com a prática médica que, por mais que tenha surgido com o positivismo, ainda permanecia, ao menos no âmbito da psiquiatria, muito ligada a pensamentos místicos, políticos, religiosos ou de influencia imaginária. Portanto, os grandes asilos não eram feitos especialmente aos “loucos”, isto é, aos hoje chamados de loucos, mas o conceito de loucura da época era de tal forma genérico e impreciso que podia abranger toda sorte de sortilégios sociais. Um homem, por exemplo, foi preso no século XVII por não ficar de pé na igreja nas horas corretas. Os mendigos eram presos junto com os vagabundos, os pervertidos, os loucos, etc. “O internamento seria assim a eliminação espontânea dos ‘a-sociais’” (Foucault, 79).

Os donos do asilos durante o século XVII e XVIII eram religiosos de alta conta ou muitas vezes burgueses, especialmente depois que a revolução positivista foi se apropriando do poder de forma mais nítida. Dessa forma o poder burguês ou do clero utilizava-se dos asilos para manter tanto a ordem social, evitando revoltas, tal como para escamotear a fealdade social, e manter a tão “em voga” ordem, razão e harmonia social. E ainda a “loucura”:

Ignorada há séculos, ou pelo menos mal conhecida, a era clássica teria começado a apreendê-la de modo obscuro como desorganização da família, desordem social, perigo para o Estado. E aos poucos esta primeira preocupação se teria organizado, e finalmente aperfeiçoado, numa consciência médica que teria formalizado como doença da natureza aquilo que até então era reconhecido apenas como mal-estar na sociedade (op. cit, 80).

Dessa forma criou-se, através de subterfúgios diversos, uma visão de loucura ampla, conceito tão mal definido que a medida de sua ampliação era a medida de sua indefinição. Todos os a-sociais eram loucos. A partir daí pensou-se em muitas punições e “tratamentos” para esses indivíduos mal vistos e firmemente repudiados a partir da era clássica onde eles perdiam seus entornos míticos, ou talvez, ganhassem uma nova mitologia.

Do trabalho da loucura

Até a Renascença a loucura era percebida em um aspecto transcendente e imaginário, aspecto este que dava conta de suportá-la, pois lá ela era atribuída de sentido. O mundo da Renascença era o mundo ainda povoado de multiplicidades o que viria a mudar na época clássica. Segundo Foucault:

O ‘Cosmos’ da Renascença, tão rico em comunicação e simbolismos internos, dominado inteiramente pela presença cruzada dos astros, desapareceu, sem que a ‘natureza tenha encontrado sua condição de universalidade, sem que acolha o reconhecimento lírico do homem e o conduza no ritimo de suas estações. O que os clássicos retem do ‘mundo’, o que já pressentem ‘natureza’, é uma lei extremamente abstrata, que no entanto constitui a oposição mais viva e mais concreta, a do dia e da noite. Não é a época fatal dos planetas, não é ainda a época lírica das estações; é o tempo universal, mas absolutamente dividido, da claridade e das trevas. (Op cit., 244-245)

Com o advento da era clássica a famosa dualidade retoma seu campo. Luz e escuridão, noite e dia, bom e mau, certo e errado, verdadeiro ou falso. A era clássica, por mais que não possa ser resumida a isto, torna seu caráter maniqueísta explicito. Essa era passa a julgar de maneira muito mais moralizada os sujeitos de sua história, rejeitando os inúteis sociais, isto é, aqueles aos quais não faziam parte da grande comunidade do Trabalho. É aí, portanto, que a loucura começa a sua demarcação que caminha para a contemporaneidade, na era clássica aparece finalmente o conceito de “desatino” que servirá para marcar este lugar, o lugar do louco, do mendigo, daquele que não trabalha e foge dos padrões morais desta sociedade trabalhista, afinal, “qualquer trabalho é melhor do que nenhum”. Dessa forma é justamente:

“nesse outro mundo, delimitado pelos poderes sagrados do labor, que a loucura vai adquirir esse estatuto que lhe reconhecemos. Se existe na loucura clássica alguma coisa que fala de outro lugar e de outra coisa, não é porque o louco vem de um outro céu, o do insano, ostentando seus signos. É porque atravessa por conta própria as fronteiras da ordem burguesa, alienando-se fora dos limites sacros de sua ética”. (op. cit, p.73).

É esse o tempo da ética protestante que toma de assalto o mundo da transcendência e torna-se aos poucos transcendente por si só. Nesse tempo Calvino poderá dizer: “Não tentarás o Eterno, teu Senhor”, e pergunta: “Não querer trabalhar, não é ‘pôr à prova o poder de Deus’?” (Calvino apud Foucault, p.72). O Hospital Geral na França passa por ter a função de impedir a mendicância e a ociosidade, fontes poderosas do mal. Sobre a irradiação do Trabalho como a grande Opus de Deus estão os asilos, que tomarão uma forma de impedimento, não permitindo que os não trabalhadores sejam aceitos pela comunidade e, é justamente:

“nesses lugares da ociosidade maldita e condenada, nesse espaço inventado por uma sociedade que decifrava na lei do trabalho uma transcendência ética, que a loucura vai aparecer e rapidamente desenvolver-se ao ponto de anexá-los” (op. cit: p.73).

É neste local que a loucura toma a antiga posição dos leprosários, lugar onde se alojavam os miseráveis, vagabundos e desempregados, em suma, o mal sócio-espiritual manifestado. De que forma se daria, portanto, uma solução a toda essa espécie de desvairados? Somente através do trabalho obrigatório, com certeza, mas não o mero trabalho, pois ali não existe dissolução entre aspectos econômicos e morais, o objetivo se coloca também como forma de punição até se tornarem mais visíveis as técnicas do “despertar” que serão muito utilizadas no final do século XVIII e no século XIX. Dessa forma podemos observar o hospício além da retenção de subversivos e desatinados:

Mas fora os períodos de crise, o internamento adquire um outro sentido. Sua função de repressão vê-se atribuída de uma nova utilidade. Não se trata mais de prender os sem trabalho, mas de dar trabalho aos que foram presos, fazendo-os servir com isso a prosperidade de todos. A alternativa é clara: mão de obra barata nos tempos de pleno desemprego e de altos salários, e em períodos de desemprego, reabsorção dos ociosos e proteção social contra agitação e revoltas” (op. cit, p. 67).

É ainda nos regulamentos do Hospital Geral que vemos de que forma essa autoridade em forma jurídica se dava em relação à punição (explicitando bem a postura não médica, mas jurídica da internação), segundo este regulamento os diretores do hospital: “Têm todo o poder de autoridade, de direção, de administração, de polícia, jurisdição, correção e punição” (op. cit, 74).

A política então será de internação, de não aceitação dos loucos no espaço social dos burgos, mas estes não-seres deveriam ser colocados num espaço a margem, no hospício. A lógica do hospício, de retenção dos indivíduos que causam perigo ao Estado a lógica mercantil burguesa e a moral judaico-cristã, será mantida por muito tempo. No Brasil, por exemplo, iremos encontrar gigantescas colônias que serviam-se também do trabalho como forma de gerar capital e como forma de tratamento moral.

“Considerando a extensão do Brasil, assistimos a uma proliferação de macrocolônias de alienados por todos os cantos do território nacional, quase todas criadas pelos psiquiatras Juliano Moreira e Adauto Botelho, diretores nacionais de assistência psiquiátrica entre 1910 e 1930, e 1930 e 1940, respectivamente. Em quase todos os estados existem ou existiram manicômios com o nome de um ou de outro, quando não de ambos. A colônia do Juqueri, em São Paulo, foi a maior de todas, chegando a abrigar 16 mil internos” (Amarante).

Aqui já fica evidente que essa política chegou pelo menos até a metade do século XX, onde só foi diminuir após os movimentos anti-manicomiais começados com Basaglia e com os movimentos dos trabalhadores de saúde mental como aconteceu no Brasil. A nova ótica poderia atacar diretamente os mecanismos de exclusão e da instituição total que se criaram, modelos totalitários que seguiam muito a lógica mecânica e anti-individualizante de um grande período da ascensão industrial. Dentro dessa lógica, vimos a violência, os maus tratos e a humilhação das pessoas transformadas em entes e especialmente a naturalização da doença. O que eram espíritos maus que invadiam os acometidos passava a ser doença, o que não deixou suas bases projetivas. A separação sujeito-objeto, se é que houve de fato nesta época, foi muito mais conceitual do que factual.

Ainda no Brasil, Rodrigues Caldas, diretor da colônia Juliano Moreira em 1920, em seu discurso inaugural disse estar pronto para lidar com: "os delicados problemas atuais de higiene e defesa social pertinentes aos deveres do Estado para com os tarados e desvalidados de fortuna, do espírito ou do caráter, para com os ébrios, loucos e menores retardados, ou deliquentes abandonados, assim como para com os indesejáveis inimigos da ordem e do bem público, alucinados pelo delírio vermelho e fanático das sanguinárias e perigosíssimas doutrinas anarquistas ou comunistas".

Aqui temos uma união bombástica, que durou grandes períodos, presos políticos eram misturados com os delinqüentes, os considerados inválidos, os de comportamento aconvencional, os pobres, “loucos”. Todos eram, de fato, uma preocupação do Estado e da ordem burguesa.

Talvez aqui podemos lembrar da origem etimológica de trabalho:

Nos países de língua germânica, a palavra “Arbeit" significa trabalho árduo de uma criança órfã e, por isso, serva. No latim, “laborare” significava algo como o ‘balançar do corpo sob uma carga pesada’, e em geral é usado para designar o sofrimento e o mau trato do escravo. As palavras românicas ‘travail’, ‘trabajo’ etc. derivam-se do latim, ‘tripalium’, uma espécie de canga utilizada para a tortura e o castigo de escravos e outros não livres. A expressão idiomática alemã – ‘canga do trabalho’ (‘Joch der Arbeit’) – ainda faz lembrar este sentido (Krisis, 45-46).
Falar de violência, e talvez mais ainda de criminalidade, é complicado. Isso é algo que a esquerda no Brasil não quer reconhecer, e... a população em geral. Quando se põe o assunto em pauta, existe já uma certa resposta "pronta": a criminalidade é fruto da desigualdade social, falta de oportunidades, de alternativas etc. É assim que os clichês sociólogicos se reproduzem em larga escala na opinião pública. Toda vez que o telejornal resolve fazer um complemento da notícia, ou então "discutir" o problema da criminalidade, lá vem a figura do sociólogo. Este lança na boca do povo o novo "refrão" da academia: invisibilidade social, sociedade de consumo etc. Tudo isso é interessante de ser pensado, e claro, não quero bancar o arrogante e dizer que isso não contribui para a questão. O problema é que muito disso é absorvido a-criticamente, e como de praxe, os nossos papaguaios saem por aí, nos bate-papos da vida, prontos para colocar a agulha no vinil. Aí, pronto: os conceitos se transformam em barulho de fundo. A preguiça intelectual os produziu deste jeito, e eles devem, por sua vez, fortalecê-la. Não tiro razão de certos liberais, por exemplo, quando vêm nos questionar sobre as causas da criminalidade: ora, sem a causa principal da criminalidade é a desigualdade social produzida pelo capitalismo, como explicar que, num país pobre como a Índia, e cheio de desnivelamentos devido ao sistema de castas, haja um índice muito menor de violência que no Brasil? Ou sei lá... existem vários outros exemplos.

A criminalidade e a violência são fatos complexos. O que acontece é que, desde há muito tempo, a esquerda padece de um mal - a preguiça intelectual. Ser de esquerda hoje já não significa ser um "opositor". Ser um "opositor" na política, ou anti-politicamente no caso do anarquismo, seria fazer parte de uma minoria insatisfeita. Mas, ora bolas, desde quando a esquerda é minoria? É só contar a partir do momento em que Che Guevara virou um ícone pop, Marx uma referência na academia e que Lula foi eleito presidente da República. Sem contar a (hoje) ampla difusão do marxismo e do anarquismo nas livrarias, a produção de filmes baseados em temática esquerdista (Os Sonhadores...) e por aí vai. Parece que, na louca intuição da nossa direita paranóica, existe um fundo de verdade: os esquerdistas dominam hoje a vida pública, ao ponto de ser feio e politicamente incorreto declarar-se de direita. É só reparar - quando se indaga, ninguém diz que é de direita. No pior dos casos, é um direitista enrustido (eu tenho um exemplo aqui bem perto! hehe). Parece que a direita foi achincalhada juntamente com seus valores - e eu estaria sendo irrealista se não dissesse que, no entanto, estes valores encontram ainda muita adesão entre as camadas baixas, principalmente. Achincalhada pela esquerda, que finalmente, depois de muito tempo escondida no movimento estudantil, gestando-se entre os hippongas universitários do marxismo-leninismo, entre uma baforada e outra de cannabis, agora põe sua cara a tapa no poder. E, claro, estaria sendo mais irrealista ainda se não dissesse que essa esquerda, agora no poder, faz um governo voltado para as elites (inclusive para si mesma, como nos tem provado os repetitivos escândalos) com "salpicadas" de populismo. E põe "salpicadas" nisso. Na ótica do burguês maré-braba, pode até parecer que, de fato, se trata de um governo de esquerda, pois nunca se viu tanto a atenção do Estado, e dos poderes do Estado, voltada para o povão, privilegiado com mil e um programas de assistência populis... digo, social (ou seria "miséria assistida"?).

Pois este contexto político é muito diferente do que tínhamos no século XIX. Lá atrás, ser de esquerda (anarquista, comunista ou social-democrata) dava cadeia, e provavelmente não era "bonito", nem para a burguesia nem para a classe média. Os padres, como tinham algum monópolio da educação, faziam questão de falar besteira sobre os comunistas e anarquistas, para que os jovens (e os fiéis) ficassem bem longe deles. Ao contrário, hoje soa até "humanista" você se declarar de esquerda. Quem é de direita é insensível. Ora, com uma inversão destas, acaba a necessidade de pensar. O pensamento é fruto da inquietude, dizia o filósofo. Para quem está gozando de certo privilégio, não precisa se incomodar. Talvez por isso a agitação da direita em certos países da Europa (Le Pen etc).

Parece que existe também uma certa tendência dos partidários da esquerda em fazer abstração da conjuntura. O pessoal fica tão entusiasmado com esse negócio de Revolução que acaba ficando otimista demais, como se a famigerada estivesse logo ali, ao nosso alcance. Mas, "tipo assim"... e a conjuntura? Como é que vai a "classe revolucionária"? Contrariando todas as expectativas. "Como é que tá essa força?". Força?? Que força? Nosso partido/grupo tem apenas 5 membros fixos. É assim que andamos. Talvez por isso eu ache Adorno tão interessante: seu ponto de partida, segundo ele mesmo, seria o momento em que a filosofia, "que outrora parecia superada, mantém-se viva porque o momento de sua realização foi perdido". A esquerda também sempre foi tarada pela prática, inegavelmente. O pensamento sempre lhe pareceu tarefa pouco-nobre, coisa de "pequeno-burguês". Certamente, mais nobre seria dedicar oito ou doze horas do seu dia, trancafiado num lugar quente e feio de doer, fabricando sapatos!! Depois de uma jornada dessas, do "trabalhador forte e fecundo" da Internacional só sobra o bestializado, franzino e infeliz trabalhador. "O trabalho forma" foi uma das maiores mentiras que a esquerda jamais acreditou. E, agora que a teoria caiu em descrédito, sobra o "oba-oba" do ativismo ou pragmatismo da revolução brecada.

Bom, eu desviei enormemente o assunto, mas isso tudo era para dissecar uma esquerda que há muito tempo desaprendeu a pensar. O assunto inicial era a criminalidade, mas, como não gosto de censurar, deixei a coisa ir. Um texto sobre criminalidade e violência vai sair ainda. Fiquem no aguardo. rs

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Curso de Extensão "ANARQUISMO SOCIAL"

CURSO GRATUITO

LOCAL:
Auditório - Bloco O, do Instituto de Ciências Humanas e Filosofia (ICHF),
que fica no Campus do Gragoatá (entrada próximo à Praça da Cantareira -
bairro São Domingos), Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói - RJ

Para se inscrever: oficinaspronex@gmail.com

Tel.: (21) 2629-2949

Qual é a proposta do Curso de Extensão "ANARQUISMO SOCIAL"?

Desde 2002 (ano de criação do GEA - Grupo de Estudos do Anarquismo), os nossos debates sobre anarquismo vêm se articulando muito mais com a construção política e social das propostas libertárias (históricas e atuais) do que com aspectos mais isolados ou subjetivos, que podem estar ligados ao tema. Este curso, então, pretende proporcionar aos(às) participantes um conjunto substancial de exposições e reflexões para o entendimento das propostas anarquistas realizadas ao longo tempo (desde a metade do século XIX até os dias de hoje) em diversos lugares do mundo. As propostas anarquistas - distantes das formulações "utópicas" ou apenas
teóricas e filosóficas, destacaram-se na formação de instâncias de luta contra a exploração movida pelas classes burguesas e capitalistas e contra o reformismo e a burocracia do Estado; na participação em revoluções populares; e na construção de estruturas sociais antiautoritárias, democráticas e autogestionárias. Por conta da imposição do Estado e do peso do arsenal autoritário sobre as sociedades, para a maioria das pessoas o anarquismo não se encontra nas páginas da História. Portanto, o curso de extensão é um ótimo momento para a aquisição de conhecimento deste universo "novo".

O projeto Curso de Extensão: Anarquismo Social conta com o apoio do PRONEX (FAPERJ / CNPQ), coordenado pelo Prof. Daniel Aarão Reis Filho.

Programação:

10 DE NOVEMBRO
8h - 12h
TEMA: Proudhon, Bakunin e Malatesta
Palestrantes: Alexandre Ribeiro Samis(1) e Felipe Corrêa(2)
(1) Doutor em História pela UFF e Professor de História do Colégio Pedro
II;
(2) Editor e Pós-graduado em Ciências Sociais pela ESP-SP;

14h - 18h
TEMA: Anarquismo e as Revoluções Russa e Espanhola
Palestrantes: Robledo Mendes(3) e Milton Lopes(4)
(3) Graduado em Agronomia pela UFRRJ e Professor de Biologia da Rede de
Ensino Particular da Baixada Fluminense;
(4) Jornalista e membro do Núcleo de Pesquisas Marques da Costa (NPMC -
Federação Anarquista do Rio de Janeiro / FARJ);

24 DE NOVEMBRO
8h - 12h
TEMA: Ricardo Flores Magón e a Revolução Mexicana
Palestrante: Alexandre Ribeiro Samis

14h - 18h
TEMA: História do Anarquismo no Brasil
Palestrante: Carlos Augusto Addor(5)
(5)Professor Adjunto do Departamento de História da UFF;

08 DE DEZEMBRO
8h - 12h
TEMA: Anarquismo Hoje: Contracultura ou Inserção Social
Palestrantes: Rafael Borges Deminicis(6), João Hernrique Oliveira(7) e
Rafael Viana(8)
(6) Graduado em História pela UFF e Mestando em Sociologia Política pela
UENF;
(7) Graduado em Jornalismo pela UFF e Mestre em História pela UFF;
(8) Graduando em História pela UFRJ;

Sobre o GEA:

O Grupo se reúne mensalmente, na sala 216 / Bloco N (sala do NEC), UFF-Niterói, Campus do Gragoatá (Referência: ao chegar na Praça da Cantareira, bairro São Domingos, procurar pela entrada do Campus do Gragoatá e perguntar pelo ICHF – Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia).

Porém, nestes últimos meses o grupo tem se reunido também na sala do > Arquivo de Memória Operária do Rio de Janeiro (AMORJ) que fica no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS), da UFRJ, no Largo do São Francisco, Centro, Rio de Janeiro – RJ, às 17 hs.

Os textos do Grupo estão dispostos na pasta 666, Xerox, Bloco N, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia (ICHF) – loja do Marcelo - UFF.
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Contatos:

http://www.geauff.blogspot.com/
e-mail: gea_nec2@yahoo.com.br
Tels.: (21) 2629-2949 ou (21) 9791-8426 (Coordenador do grupo: João
Henrique)

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terça-feira, 25 de setembro de 2007

pensamentos

No Brasil, ninguém tem propriedade para falar da violência. Nem o vulgo nem o douto se mostram aptos a um tal ofício. De certa forma, tivemos nossas licenças cassadas pelo estado calamitoso - para não dizer apocalíptico - em que vivemos. Imersos em tal situação, vamos ficando cada vez mais insensíveis, petrificados, e isso se reflete na extinção do pensamento crítico, no soterramento de todo impulso libertário, e por aí vai, até o ponto em que nos tornamos fascistas em potencial. Fica até difícil falar de um assunto tão delicado. Toda cautela é pouca. Pressentimos que toda tentativa de falar de forma honesta pode incorrer na hipocrisia. Quais são os sentimentos e intenções em jogo? Como evitar o egocentrismo, o exibicionismo? Como tornar mais autêntica a expressão... ou menos inautêntica?
Qualquer manifestação além do mero mal-estar subjetivo parece ser luxo perto da merda que vemos todo dia. E ainda, qual seria o valor da arte (e já se perguntavam isso os dadaístas em meados do século XX) frente à barbárie? A arte se justificaria ainda, a despeito da patente ausência do Belo? Como ouvir uma bela sinfonia se o som de fundo permanece sendo o de gritos de horror?

Qual o combustível da arte hoje em dia? Qual a sua motivação? Seria a positividade? Encher o mundo daquilo que ele não tem? É preciso indagar qual o sentido de pintar lagos cristalinos quando eles se tornaram uma espécie em extinção, subsistindo a não ser em nossos inventários. Daqui a pouco esqueceremos a imagem (autêntica) do mundo. Perderemos a noção de verdadeiro, que segundo Debord seria já um apêndice do falso, um "momento" deste. Na propaganda e no cinema, nas novelas e revistas de moda, encontramos um mundo completamente outro, cheio de luz. Mas onde está a semelhança?? Mesmo quando se retrata a guerra ou a miséria, isto nada remedia. A patética dramaticidade, ingrediente indispensável para o sucesso comercial, é aplicada em dose calculadamente exagerada. De repente, num passe de mágica, até a merda da guerra vira uma bela obra cinematográfica. É preciso abrir os olhos para aquilo que Adorno chamou "Indústria Cultural" (ou "o Iluminismo como mistificação das massas"). Para Adorno, até onde sei, o último traço de resistência num mundo subsumido pelo capital estaria na arte. A arte teria a função de expressar a negatividade, o "não-idêntico", de alimentar o descontentamento.

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As discussões recentes em torno do filme "Tropa de Elite" (que eu ainda não vi) mostram o quanto estamos próximos do fascismo, ou o quanto a população é capaz de se identificar com o tal "Capitão Nascimento", de vibrar a cada tiro que ele desfere, a cada pontapé na cara do bandido. João Paulo Cuenca escreveu sobre como a sessão de pré-estréia se tornou um ritual de descarrego: o público, num "frisson de adrenalina", aplaudindo de pé a truculência dos "mocinhos". Há quem diga que o próprio filme faz do personagem (um torturador) um herói... não posso dizer nada pois ainda não o vi.

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Denúncia: a violência está a tal ponto integrada ao nosso cotidiano que daqui a pouco será difícil distingui-la da paisagem. Quem sabe logo chegue o dia em que não mais constará nas páginas dos jornais, pois que de tão corriqueiro, deixou de merecer o seu espaço entre as notícias. Mas não falo só da violência direta, perceptível, da troca de tiros e das excursões da polícia nas favelas, do Caveirão etc. Falo da violência de um modo geral, da degradação das relações humanas, da insensibilidade e indiferença generalizadas. Falo dos cortadores de cana no Nordeste assim como dos executivos de São Paulo. Falo do trânsito e dos desaforos-que-não-são-levados-para-casa. Falo do racismo e do sexismo. Do assassínio da personalidade humana pelo processo de conformação ao trabalho - processo este que todos nós estamos inseridos, sejamos meros "estudantes" ou não. Falo da imprevidência da classe média, do discurso intolerante do plebeu. Do ódio compartilhado das torcidas de futebol. Falo dos jornais. Sim, pois a imprensa apenas aparentemente presta um serviço à sociedade: a médio ou longo prazo, compromete os sentidos, e assim vamos sendo esvaziados. Com efeito, não podemos mais nos pretender "puros", ou pretender a existência de um "sujeito revolucionário" puro. É uma ingenuidade muito grande. Como se, imersos nos mecanismos viciados do sistema, pudéssemos estar isentos de suas contradições. É aqui que o mito da "pureza ideológica" se arrebenta violentamente contra o muro da economia globalizada. Se todas as ações estão imbricadas (a nível mundial), não tem mais como escapar das garras do pecado. Ir no cinema pode ser tão criminoso quanto servir os EUA no Iraque. O dinheiro passa de uma mão a outra, e o (hoje colossal) edifício da divisão social do trabalho contribui mais do que nunca para a completa alienação do indivíduo.

Pois acertou quem disse que o Brasil é a "fratura (exposta) do mundo". Como se sabe, a essência do capitalismo é a violência. Se um dos marcos históricos da modernização foi a expropriação das terras comunais na Inglaterra em proveito da criação de lã para a indústria têxtil, o Capital continua sendo, todavia, um "processo-forma", um "processo de formação das relações sociais" (Holloway). Seria um processo de separar o fazer do feito, os trabalhadores dos seus meios de vida, o trabalho manual do intelectual e assim por diante. Um processo contínuo de privação, de cercar e delimitar, de des-socialização das pessoas.
E onde residiria a esperança? Para encontrá-la temos que olhar a coisa do ponto de vista do "não-idêntico", isto é, daquilo que, embora existindo sob a sombra do capital, contraria secretamente a sua lógica. Holloway explica que o capitalismo não "é": ele não "foi" um dia no século XVIII e agora, infelizmente, teríamos que suportá-lo "até que", num belo dia, haja a revolução. O processo (violento) de imposição do capitalismo gera um contra-processo, o impulso pela autodeterminação social. Se o capitalismo é a negação de nossa dignidade, de nossa humanidade, não temos outra escolha a não ser erigir barricadas (subjetivas) e declarar guerra.

Nós somos o "sentido consistente da não-identidade", "negação da negação": à negação de nossas vidas, respondemos com um Não ressonante. O ponto de esperança reside em que o capital não é uma coisa, e sim uma relação social. Ele só existe a partir do momento em que o fazer humano é conformado ao trabalho abstrato, produtor de mercadorias, separado no tempo e no espaço das demais atividades. Se a conformação falhar, se os trabalhadores se rebelarem contra a contenção da sua atividade, a existência do capital está sofrendo sério risco. A subversão do trabalho em um fazer criativo, livre, autodeterminado e sobretudo sensível às necessidades, subversão que só pode vir de dentro, é o segredo da transformação social. Criar outras formas de relacionamento social amplo para além do dinheiro e da mercadoria constitui a idéia-chave do anticapitalismo. E isso pode ser alcançado de várias maneiras, pois o próprio mundo que nos espera seria um mundo plural.

Resta saber se ainda tem volta. Não podemos mais ter certeza de nada. Será que depois de tanta merda, da bomba atômica e das duas grandes guerras e do 11 de Setembro haveria ainda espaço para sonhar? O peso da violência é tão grande que é capaz de suprimir todo impulso libertador nas pessoas. E assim caminha a humanidade, pendendo cada vez mais para o fascismo, para os fundamentalismos (religiosos ou não) e nacionalismos. O povo quer sangue. Em plena crise da sociedade da mercadoria, quem poderá nos ajudar? Bush? Capitão Nascimento? Bin Laden? Le Pen? Lula? Deus? Fica a pergunta de quem seria o melhor ditador.