quinta-feira, 26 de julho de 2007

Tio Durden entra na polêmica: Bookchin e Bey a missão.

Parte I

Como o inútil do Guerra prefere desfrutar de férias pitorescas em recantos insólitos da Europa ao invés de produzir algo teóricamente aceitável, resta ao Frei Nando e ao tio Durden a tarefa de se digladiarem em torno das polêmicas deste recanto libertário de layout e formatação de texto duvidosos, diga-se de passagem. Dividi em partes. Só escrevi a primeira até para não "fechar" minha opinião. Quero emitir e receber, pra construir meus argumentos numa troca. Coisas fechadas demais e sem opções me dão calafrios.

Primeiramente eu gostaria de elucidar algumas questões. Desembaraçar alguns nós conceituais.

É preciso, antes mesmo de citar o Hakim Bey e o Bookchin localizá-los históricamente. Enxergar de onde falam, que tradições representam, que sedimentos teóricos estão assentados. Ambos são de carne e osso(apesar da mitológica multi-presença de Bey, quem escreve escreve de algum lugar), estão localizados no tempo e no espaço. Isso é importante, pois há um vício recorrente dentro da filosofia e da sociologia em se trabalhar conceitos descolados da realidade em que estes encerram. Há uma preocupação muito grande em esmerilhar e esmiuçar os conceitos sem localizar que há um tempo histórico definido que os abriga.

Uma breve biografia dos distintos srs: Murray Bookchin é um gigante do pensamento libertário contemporâneo, nasceu em 14 de janeiro de 1921 e faleceu em 30 de julho de 2006, fundador da ecologia social, foi um brilhante acadêmico, com contribuições importantes não só ao movimento anarquista, mas aos movimentos ecologistas e à esquerda em geral. Militou em diversas organizações políticas, tais como a Liga Libertária, filho de militantes da IWW, ligado a movimentos alternativos participando de lutas dos anos 60 pelos direitos civis e contra a guerra do Vietnã, participou do primeiro de maio em 68, em Paris bla bla bla bla, com todo o respeito que os bla bla blás encerram. Em suma o cara foi um picão, me desculpem as sexistas policiólogas de plantão ou os anarcômetros de linguagem presentes.

Vamos falar do Bey: Tio Bey, Hakim Bey, mais conhecido como Peter Lamborn Wilson é um escritor, ensaísta e poeta que se entitula como um "anarquista ontológico". Intoduziu alguns conceitos sobre as TAZ's(Zonas Autônomas Temporárias) a partir de seus estudos históricos sobre as utopias piratas no fim da década de 90 foi amplamente reconhecido no mundo todo, escreveu sobre Charles Fourier, Friedrich Nietzsche e foi afiliado a Academia de Filosofia Iraniana e saindo do país durante a Revolução Islâmica. Na década de 80 influenciado por René Guénon estudou a fundo as idéias do anarquismo e do situacionismo com sufismo e Neopaganismo, e escrevendo sobre suas idéias de sobre "anarquismo ontológico" e "imediatismo", desnecessário outro palavrão chulo para medir a capacidade intelectual de nosso amigo Bey.

Coloquei os dois perfis aqui, para tentar localizar os leitores. Bookchin apesar de também intelectual tem uma tradição de militância visívelmente mais concreta, com uma experiência em movimentos de massa que no caso de Bey é algo distante e esfumaçado. Atrevo-me a dizer que o máximo que Bey chegou de movimentos populares foi em algum livro de biblioteca. O que não muda sua consistente e inventiva capacidade de revolucionar idéias, comportamentos, mas dá a tônica para tentarmos entender toda o vociferal texto de Bookchin. Não vou cair(podem me segurar), na dicotomia militante x intelectual, idéia x ação, teoria x prática, até por que as idéias de Bey e a prática de Bookchin são lados de uma mesma moeda. Isto não invalida a discussão da obra de Bey, mas dá caldo para entendermos coisas mais concretas: como o marasmo e a falta de presença do anarquismo como algo de relevância nas lutas sociais.

Bey influencia uma geração inteira de ativistas e isso não é algo para se jogar fora, se faz isso, (e reutilizando uma expressão "cult" da academia) é por que tem a "sacação" do zeitgeist do tempo em que vive e o faz excelentemente bem(eu também comprei aquele livro da Baderna, eu confesso!). O que é de se admirar. Não vou perder mais um parágrafo elogiando o Bey nem o Bookchin, vamos partir para o concreto agora.

As críticas de Bookchin são parte de alguém que viveu a geração de 60 e de 68(uma geração tão inventiva e criativa como a nossa, talvez até mais e preocupada mais com revoluções individuais do que as coletivas diga-se de passagem), e sabe muito bem até onde vão idéias absolutamente geniais sem uma preocupação consistente em que estas caminhem conjuntamente com um movimento de massas organizado. Pode até ser que o cara tenha ficado mais rançoso e seu viés marxista(de onde surgira políticamente) tenha aflorado diante de tanta merda(sim! conviva com um grupo de neo-anarquistas durante 1 mês e saberá o que eu estou dizendo) anarco-pop.

Meu camarada Fernando R. afirma que Bookchin em seu "delírio positivista" não aceita a diferença dentro do anarquismo. Ao contrário do que afirma o companheiro, há em muitas de suas obras grandes respaldos para esta diferença existir; é justamente o municipalismo libertário, conceito multi-polar de organização político, cunhado por Bookchin que dá a diferença, a multiplicidade, toda a liberdade para enraizar-se.

É claro que há um ranço positivista em Bookchin(vamos dar um desconto, o cara morreu com 85 anos de idade, não chupou chupeta na contra cultura minha gente, sua tradição é mais antiga que isto), isso fica claro com o texto sobre Religião e Anarquismo, que pra mim é um dos mais infelizes que ele já escreveu, há também uma austeridade em seu pensamento, que não chega a ser apolínea como afirma meu querido companheiro de blog, mas afirmar que Bookchin é materialista histórico, calma lá! O cara bem ou mal, tirando seus surtos austeuros, "não acha que mudando os meios materiais de uma sociedade e os meios de produção muda-se o pensamento da sociedade. Bookchin rompeu com marxismo (e isso passa por romper com um de seus pilares centrais que é justamente o materialismo histórico citado feijão com arroz aí em cima).

Mas dando uma cutucada com a vara curta, sem as tais condições materiais, fica difícil imaginar a diferença existindo caros amigos, vide o capitalismo, que não dá condições para nenhuma diferença existir, uniformiza, massacra, conduz e unifica tudo sob a égide do lucro, da competitividade. E sabemos muito bem o que o capitalismo faz com os ideais de libertação individual: ele os assimila, os embala e transforma em mercadoria, em prateleiras de consumo que nada representam de ameça real aos pilares do sistema capitalista. Talvez seja esta a preocupação e a crítica central de Murray Bookchin.

Mas também não podemos cair nsse papo de condições materais primeiro e liberdade amanhã, isso é papo de marxista e nisso o tio Bey está certo, liberdade agora, novas formas de luta, mudança individual, libertação individual, que venham para agregar ao caleidoscópio anarquista(adorei a definição)!

(ufa! que trabalho dá romper as dicotomias e integrá-las) *

Mas é fato que o movimento anarquista carece de expressões coletivas de luta significativas, e me parece esta a crítica central de Bookchin. Uma crítica assentada sob uma perspectiva e análises históricas(não a-históricas abstraídas do contexto social).

Bookchin já viu grupos e indivíduos defendendo expressões semelhantes a de Bey em outros momentos da história desintegrarem-se como farinha no deserto. Localizaram a procedência da crítica?

A preocupação de Bookchin procede. Os jovens libertários-liberados de 68 são grande parte dos burocratas de hoje, que enxergam 68 como um grande "parque de diversões" que teve tempo e hora para acabar(autônomo e temporário), parte do processo traumático da juventude "liberada", que após romper os padrões de determinada época assimila e constrói novos dogmas e paradigmas de mercado e de moral e os põe a disposição dos setores com capacidade de consumo. Eu gostaria de deixar claro que acho o conceito de TAZ interessantíssimo, gosto dos livros do Hakim Bey, mas há uma tendência e nisto Bookchin está correto em se rejeitar aspectos primordiais do anarquismo: autogestão, organização, federalismo, consenso, por espasmos individuais proto-libertários. Como se a tal mudança não fosse um junção destes dois fatores: mudanças individuais e mudanças coletivas.

Como disse meu amigo em trecho anterior: "Que o anarquismo ontológico possa nos prover como meio de encontrar nossa singularidade, nossos momentos limites alterando-nos nas profundezas e não só na superfície..."

Mas NÓS QUEM CARA PÁLIDA? Já que estamos falando de singularidade e diversidade, vamos aos fatos... O anarquismo ontológico pode ser até algo muito bom em convencer meia dúzia de jovens classe-média, neoístas, caoístas, neo-anarquistas, intelectuais de esquerda e estudantes universitários... Mas à classe trabalhadora ele não passa de um jargão indecifrável e confuso, um idioma excêntrico e estranho que não atende seus anseios mais básicos(e ligados diretamente às suas realidades).

Muito além da dicotomia Bookchin x Bey, é fato que todas as idéias de Bookchin estão centradas na questão coletiva a partir de experiências concretas, e de que o anarquismo mais carece de representação e importância que me parecem atualmente, mais fundamentais a serem discutidas, já Bey concentra-se na questão individual, igualmente importante, mas que infelizmente não atende à realidades populares, e sim uma elite intelectual bem informada e com boa capacidade de consumo para obter seus livros infelizmente.

Os textos de Hakim Bey são uma reação honesta e necessária contra a esquerda burocrática, a geração de 68 que agora dirige confortávelmente seus carros importados e toma seus dry martinis nos finais de semana, aparelhada, aparelhista, dirigida, dirigista.

O texto de Bookchin é uma resposta aos que super-estimam a liberação individual como forma de derrotar o capitalismo e esquecem-se de que houve e há um anarquismo que não é conceitual nem teórico, mas histórico e ligado a derrotas das quais podemos extrair valiosas lições.

O erro de Bookchin é a já tão citada razão tecnificada(o tecnificado é meu adendo) já citada brilhantemente por nosso camarada Fernando, a de Bey é não historicizar o anarquismo(algo que Bob Black faz de maneira mais estúpida que ele diga-se de passagem), nem reivindicar tradições que seriam importantes ao seu pensamento. Eu entendo também que se ele historicizasse o anarquismo ele provávelmente não seria o Bey(ele é iconoclasta demais para prestar qualquer tipo de reverência) e nós não estaríamos aqui discutindo exaustivamente isto.

São ossos do ofício. E repetindo a frase de meu amigo em total concordância: "Ainda há vida por entre Bey e Bookchyn..."

* Sem dicotomias rígidas não existiriam novelas, times de futebol, o pstu e toda a sociedade ocidental-cristã.

obs: garotos JUSTIFIQUEM seus textos, não estou falando de argumentos, tal masturbação retórica lhes sobra, vide o zeitgeist, o apolíneo e o intermezzo do Fernando(êeepa), estou falando de formatação de parágrafo JUSTIFICADO, que fica mais fácil de ler. Definitivamente gente de humanas não entende nada de informática.

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